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Carlos Dias, fundador da Roger Dubuis
Fotos da Manufatura por Carlos Tiburcio
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Entrevista com Carlos Dias

domingo, 2 de março de 2008

Por Carlos Tiburcio*

A Roger Dubuis é uma marca que, apesar de seu curto período de existência, conseguiu um lugar de grande destaque no universo da alta relojoaria suíça, no qual predominam centenários fabricantes.

Fundada em 1995 pelo português Carlos Dias, em parceria com o relojoeiro independente Roger Dubuis, a marca possui um invejável portfolio de 28 movimentos “in-house”, todos eles exibindo o cobiçado Selo de Genebra – um feito único.

Na entrevista que concedeu a Relógios & Relógios na sede da manufatura, em Genebra, Carlos Dias fala com paixão das recentes mudanças que ocorreram na Manufatura, de sua relação com o Brasil e sua visão da indústria.




R&R: O que muda para a RD após a aquisição, por parte do Richemont Group, de seu departamento de produção de componentes micro-mecânicos?

CD: Não tem grandes efeitos nem modificações na estratégia de futuro da empresa. É a possibilidade de reforçar um elo de ligação com um grupo muito importante. Eu diria que este é o ponto essencial. Reforçar a nossa relação com um grupo muito importante da indústria relojoeira mundial, sobretudo na distribuição.


R&R: Tanto em produção quanto na distribuição. Haveria então a intenção do grupo Richemont de abrir novas boutiques e pontos de distribuição da Roger Dubuis?

CD: Não, se houver alguma intenção neste sentido será nossa e não do grupo Richemont, pois ele não é proprietário da empresa. Todas as decisões que dizem respeito à política de distribuição são de nossa competência, e são as relações que nós temos com os distribuidores que impõem ou não impõem determinados critérios, e que dão ou não dão a oportunidade de desfrutar do business com a abertura ou não de lojas.


R&R: Tudo com o controle e a iniciativa da Roger Dubuis.

CD: Sim.


R&R: A RD é uma das poucas marcas a produzir todos os movimentos in-house. Quais são as marcas consideradas como suas principais concorrentes?

CD: Sinceramente, eu não tenho por hábito fazer comentários sobre eventuais concorrentes. Eu direi só, que no que diz respeito a nós, há um “clube” restrito que são as pessoas que produzem movimentos em qualidade “Poiçon de Genève”. Não acho que somos concorrentes com pessoas que utilizam movimentos como 2798 ou 7750 da ETA. Eu penso que o nosso critério de trabalhar movimentos em “Poiçon de Genève” leva-nos a pertencer a um grupo extremamente restrito de duas ou três marcas. Então neste caso direi que Patek Philippe, Vacheron Constantin e Roger Dubuis... são empresas com critérios de fazer no dia a dia 100% de sua produção com “Poiçon de Genève”... já o próprio label do “Poiçon de Genève” já restringe o círculo de pessoas a englobar.

Por exemplo, se você me perguntar se Frank Muller é meu concorrente, sinceramente eu não penso que seja, pois do meu ponto de vista industrial nós não fazemos o mesmo tipo de produto. Não utilizamos movimentos comprados a outras pessoas, nem movimentos que são comuns a 100 ou 200 marcas. Por isso não há concorrência sob este aspecto.

Nós não vendemos “gato por lebre”, ou seja, não temos por hábito vender relógios caros com movimentos de pouco preço.

Este círculo de marcas que trabalham com movimentos de qualidade produzidos em casa, como a Patek, por exemplo, são casas pelas quais eu tenho imenso respeito, pois são marcas que sempre contribuíram para o patrimônio da relojoaria suíça pela seriedade na criação de movimentos, no respeito à qualidade, na ética, etc. etc.


R&R: Desde o início foi uma decisão estratégica da RD de produzir todos os movimentos com o “Poiçon de Genève”?

CD: No início foi uma vontade. Foi uma vontade que se tornou uma realidade... e hoje é uma escolha estratégica.


R&R: O que representa hoje o mercado brasileiro para a RD?

CD: Os números são muito positivos, com índice de crescimento extremamente interessante.

Para nós todos os mercados são importantes, independente do turn over, e o Brasil em consideração ao aspecto geográfico e político do próprio país... oferece um potencial extremamente importante. A marca, através de minha pessoa, tem uma conotação extremamente carinhosa no Brasil, tenho família no Brasil... tenho “uma costela brasileira”, por isto direi que a RD sempre foi muito acarinhada desde o início, e temos vários aficionados pela marca no Brasil.

O problema que hoje impacta o índice de crescimento de qualquer marca de alta gama no Brasil, apesar de estarmos completamente satisfeitos com o índice de crescimento de nossa marca no Brasil, é a indexação dos impostos na chegada dos produtos de luxo ao país. É uma decisão política que se reflete como um “handicap”, e penso que nossos produtos seriam muito mais acessíveis e mais populares se não houvesse esse inconveniente. Esperamos que as autoridades brasileiras possam evoluir (com este tema) no sentido positivo, para que as empresas relojoeiras suíças possam promover os produtos fabricados neste país com mais facilidade.


R&R: O apresentador mais importante da TV Brasileira – Fausto Silva ou “Faustão” gosta muito de relógios, e já foi visto em vários de seus programas dominicais com relógios RD.

CD: O Faustão é uma pessoa pela qual tenho muita afeição, e nos sentimos muito orgulhosos e reconhecidos por ele dar a preferência a nossos produtos. O Faustão é um brasileiro de origem portuguesa, extremamente simpático, e muito nos honra que ele tenha escolhido os nossos produtos, e que nos dê uma certa preferência.


R&R: O Senhor já visitou o Brasil?

CD: Muitas (vezes) não, quantas eu gostaria, é um país que eu aprecio muito... e até gostaria de viver neste país, sinceramente é um país que adoro... há determinadas partes do Brasil que eu aprecio muito, como Recife.


R&R: Há intenção por parte da RD em ampliar a sua distribuição no Brasil?

CD: Nós temos um distribuidor para a América do Sul (Barbados), e ele que é responsável pela abertura ou não de lojas. Neste momento a Frattina (São Paulo) faz um excelente volume de negócios, e está sempre em crescimento.


R&R: Até que ponto o Senhor se envolve na criação dos modelos da marca?

CD: Estou envolvido em todas as etapas da criação e produção dos relógios, sem exceção, e não só dos relógios, mas também das jóias.


R&R: Os relógios RD são reconhecidos, além de seu estilo inconfundível, por suas grandes dimensões. Caso haja um retorno aos tamanhos menores, a RD pretende também reduzir os seus modelos?

CD: Eu penso que nem hoje nem amanhã haverá um retorno do relógio pequenino para Senhoras... nunca mais haverá esse tempo, por uma coisa muito simples: o relógio grande não é só grande para ser visto, é grande por que é necessário que seja grande, por que a primeira função que se espera de um relógio é que se vejam as horas, senão não vale a pena comprar um relógio. Depois, o fato de o relógio ter, por minha causa, aumentado de volume é por que não só há a necessidade de se ler as horas, mas para dar força e personalidade, para que possa existir não só como um acessório banal, mas como um acessório extremamente importante e valorizante... imagina o Senhor ter uma Mercedes (automóvel) de bolso... o fato de se ver o relógio é a mesma coisa.


R&R: A presença de um português no universo da alta relojoaria suíça não é algo muito comum. O Senhor se sentia como um “estranho no ninho”?

CD: Eu penso que esta pergunta também se poderia fazer ao Vasco da Gama, por que as pessoas que estavam mais perto da Índia não a descobriram antes de lá chegar um Português... nós somos portugueses orgulhosos de ser em qualquer parte do mundo... agora é verdade que não é comum nem banal (um português no universo da alta relojoaria) isso é verdade. Você tem que ver que a relojoaria floresceu na Suíça, mas não foi aqui o berço da relojoaria. A relojoaria nasceu em França e em Londres, e por questões religiosas ou políticas é que a Suíça começou a fazer relojoaria. Eu, por questões sócio-políticas, deixei o meu país e imigrei para o estrangeiro... e cheguei à Suíça neste sentido com todos os meus conhecimentos, a minha ambição, a minha personalidade... é uma pergunta que já me foi feita talvez milhares de vezes: “O que é um Português na Suíça?”. Eu acho que é bom para a comunidade portuguesa mundial... eu penso que o Ronaldo ou o Ronaldinho fazem muito bem à comunidade brasileira como “porta bandeiras”. Por isso hoje em Espanha fala-se mais de Brasileiros que jogam futebol – e são poucos – comparados com todos os Espanhóis que lá estão... por que um Brasileiro entra lá e faz carreira: porque é melhor que os outros.


R&R: Sobre este tema do Brasil e de Portugal, em breve estaremos festejando os 200 Anos da chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil.

CD: Se encontram no Brasil, em várias partes do país, grandes obras de arte do estilo Barroco, que hoje penso entre as coisas mais bonitas que existem no Barroco, e se encontram sobretudo no Brasil.


R&R: Há alguma etapa na fabricação dos relógios RD que não seja realizada no âmbito da manufatura?

CD: Na construção do movimento são todas as etapas.


R&R: E as caixas dos relógios?

CD: Não, nós não fabricamos as caixas dos relógios aqui.


R&RHá outras empresas que fazem parte do grupo RD?

CD: Somente a Manufacture Roger Dubuis (MRD).


R&R: Qual a proporção das vendas de relógios masculinos e femininos no Brasil e no mundo?

CD: O índice de crescimento de relógios femininos é próprio de todas as marcas tanto em alta gama como em média alta... há um índice de crescimento extremamente importante nos relógios para senhoras. A marca nasceu masculina... nós só começamos a fazer relógios para senhoras depois de quatro ou cinco anos de termos lançado a marca, e hoje direi que os relógios femininos representam 35%, mas com uma tendência a subir todos os anos... mas não só em nossa empresa, em todas as empresas.


R&R: Incluindo relógios femininos com complicações, com Turbilhão, por exemplo.

CD: Com complicação e sem complicação.


R&RQual a importância da linha de relógios com pedras preciosas para a RD, tanto em modelos femininos como em masculinos?

CD: Quando lancei a marca nossos produtos eram extremamente masculinos... e não eram produtos para homens com incrustações de diamantes ou outra coisa especial. Isso veio com a criação do relógio para senhora e automaticamente também de relógio para o homem. Há determinados mercados que tem essa exigência, como por exemplo, mercados asiáticos ou mercados do meio-oriente, onde o homem tem muito mais confidência com relógios com diamantes que propriamente um típico suíço, que é apaixonado de relojoaria mais pura. Nós tivemos que seguir as necessidades destes mercados, de criar produtos que apesar de serem masculinos, mas que ofereçam um produto mais adequado a determinadas exigências locais... onde o homem não vê absolutamente nada de incompatível de trazer um relógio importante com uma grande complicação e com diamantes de porte bastante forte. Essa tendência evoluiu e penso que hoje é qualquer coisa de adquirido.


R&R: Recentemente, a RD lançou um novo site na internet, que está belíssimo. Como a marca encara a mídia internet?

CD: Eu sinceramente vejo a internet como algo extremamente positivo para a Humanidade em geral, no acesso à cultura... é muito mais popular, por exemplo, não preciso ir a Stanford para ver a biblioteca de Stanford, hoje tem na internet. A internet é um bem extraordinário... e depois direi que no caso da relojoaria e dos bens de luxo há uma grande ajuda para a formação, para a informação, para a promoção e para a visibilidade da marca. Eu direi que é uma janela aberta para o mundo, e está a nós de poder criar um valor adjunto da forma de como nós nos dirigimos ao consumidor. Tudo aquilo que nós divulgamos pela internet deve ter um caráter didático e não só um caráter de promoção. Por isso nosso site tenta não só fazer promoção e fazer com que a marca seja mais visível, mas também prover informação vista pelo ponto de vista didático.


R&R: Para concluir nossa entrevista, gostaria de lhe perguntar qual a sua mensagem para o Brasil e para nossos leitores do site Relógios & Relógios.

CD: Eu estou extremamente satisfeito de ver que o Brasil hoje está a se tornar uma das nações mais importantes do mundo, e penso que em nos próximos anos será um dos cinco “big five”. Penso que a juventude e as forças econômicas e financeiras do país têm dado uma dinâmica extremamente interessante nesses últimos anos. Vejo com apreço a viragem que o Brasil tem dado para produção de produtos complementares para a indústria energética, como o biodiesel, por exemplo... eu penso que o Brasil é um país alegre e hoje eu mesmo o vejo com os meus olhos que sorriem.


R&R: Muito obrigado pela atenção e gentileza!




*Carlos E. Tiburcio Ramos é colaborador de Relógios & Relógios e diretor da Watch Cellar.


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